A fome matou uma criança menor de dez anos a cada cinco segundos no mundo em 2006, disse hoje o relator da ONU sobre o Direito à Alimentação, Jean Ziegler. Também no ano passado, uma pessoa perdeu a vista por falta de vitamina A a cada quatro minutos, "em um planeta que poderia alimentar normalmente, ou seja, com 2,7 mil calorias diárias, 12 bilhões de pessoas", quase o dobro da população mundial, denunciou o alto funcionário das Nações Unidas. O número de vítimas da "desnutrição grave e permanente" - acrescentou - aumentou em 12 milhões em apenas um ano, passando de 842 milhões, em 2005, para 854 milhões de pessoas, o que representa um de cada seis habitantes do planeta, afirmou alto funcionário da ONU. Ziegler, que apresentou esta semana seu relatório anual ao Conselho de Direitos Humanos (CDH) reunido em Genebra até a próxima segunda-feira, defendeu que seja reconhecido o direito dos "refugiados da fome" de procurar asilo. O relator da ONU afirmou que as situações "mais terríveis" de fome ocorrem atualmente na região do Chifre da África, principalmente na Somália, no norte do Quênia e na Eritréia, além de na República Democrática do Congo (RDC) e na região sudanesa de Darfur. Essa última, localizada na região oeste do Sudão, na fronteira com o Chade, vive desde o começo de 2003 um conflito armado que deixou mais de dois milhões de deslocados internos e provocou a fuga de outras 200 mil pessoas ao país vizinho. Segundo Ziegler, o problema não é a falta de assistência internacional, mas a impossibilidade de as organizações humanitárias terem acesso às vítimas da violência, devido à insegurança na região. Por isso, apoiou a iniciativa do ministro de Assuntos Exteriores da França, Bernard Kouchner, de abrir um corredor humanitário a partir do Chade para levar ajuda à população atingida. Reconheceu, porém, que há vozes que discordam dessa idéia por considerar que isso levaria a deixar de lado o resto do território e atrairia as pessoas à região do corredor. Diante dessas situações, que refletem uma piora da situação da fome no mundo, o analista suíço disse que apresentou ao CDH uma proposta para que este elabore uma nova norma internacional que dê reconhecimento à figura do "refugiado da fome" e proíba seu retorno forçado. Explicou que a Convenção da ONU sobre o Refugiado, de 1951, limita as razões para obter refúgio à perseguição por motivos políticos, étnicos ou religiosos, e considerou deveria ser reconhecido que a incapacidade para se alimentar também é uma causa legítima. Esse tipo de pedidos de asilo devem se diferenciar dos feitos por imigrantes motivados por fatores econômicos, reconheceu. Assim, propôs que a identificação dos "refugiado da fome" corresponda à definição feita pelo Programa Mundial de Alimentos (PMA) das regiões do mundo "onde a sobrevivência não é possível devido à falta de comida". "Esta tragédia tem que acabar", exigiu o relator, acrescentando que apenas o CDH tem o poder de criar uma norma do tipo proposto. Reconheceu que as delegações européias com as quais tem conversado temem que uma medida desse tipo "aumente o movimento xenófobo". "Alguns pensam que isto poderia encorajar os movimentos xenófobos que estão progredindo em vários países da Europa", afirmou. No entanto, Ziegler considerou que tal norma é necessária, e acusou a União Européia (UE) de ter adotado uma estratégia militar para enfrentar o problema da imigração, particularmente a proveniente da África, e de "criminalizar os refugiados". Lembrou que o problema da fome se estendeu dramaticamente na África, e que, em 30 anos, o número de pessoas que sofrem dela passou de 81 milhões para 204 milhões, uma situação pela qual responsabilizou, em grande medida, "a política de dumping da UE" - venda de produtos a preços inferiores ao custo. "Na África, podem ser comprados vegetais europeus pela metade do preço dos produzidos localmente, o que elimina qualquer oportunidade de subsistência dos agricultores a
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